Como eu havia abordado no post anterior a este, a dependência química foi reconhecida como patologia incurável em 1956 pela OMS. Não tem causa específica, é multicausal, ou seja, fatores genéticos, hereditários, sociais e ambientais fazem parte das possibilidades do surgimento da doença no indivíduo. Por isso, os profissionais atuais, conhecedores e estudiosos deste assunto procuram combater, principalmente, os sintomas apresentados através da desintoxicação, medicação (caso necessária), informações sobre a doença e da reeducação do indivíduo doente, acreditando na recuperação do usuário na medida em que o mesmo pare de ingerir os tóxicos e se disponha a reformular e modificar seus hábitos de vida.
Agora, neste post quero falar um pouco sobre os caminhos percorridos pelo dependente químico, enquanto usuário abusivo de drogas psicoativas, até chegar à sua recuperação.
Frequentemente, o dependente químico, enquanto usuário ativo e consumidor abusivo do álcool ou outras drogas, demonstra através de seus repetitivos movimentos que ele “precisa” dessas substâncias para se manter física e psicologicamente “equilibrado”.
Na verdade, esta postura do “EU PRECISO” é o que o reforça a se tornar escravo das mesmas, como se a droga fizesse parte de suas necessidades e prioridades básicas de sobrevivência, como respirar e comer, passando assim a acreditar e reforçar o seu próprio desamparo diante de si, diante dos outros e diante da vida. É como se os químicos fosse uma extensão de si.
A partir do momento em que entra para o processo de recuperação, transforma o “EU PRECISO” para o “EU NÃO POSSO”: – “Eu não posso beber, eu não posso me drogar”.
Neste momento, ao aceitar sua limitação e impotência diante dos químicos, renova todo o seu movimento de escravo para uma opção mais corajosa e mais digna, passando automaticamente para outro momento ou etapa: EU NÃO VOU: “Eu não vou ao bar, eu não vou beber, eu não vou me drogar.”
Percebe diante de si um novo processo até então desconhecido por ele: O PODER DA ESCOLHA: “Eu escolho ficar abstinente, eu escolho por minha recuperação, eu escolho pela sobriedade”.
Escolher, ainda que entre dois movimentos difíceis, naquele momento o faz sentir forte e responsável por suas próprias ações e por sua própria vida.
E com a responsabilidade de suas próprias escolhas, percebe dentro de si um poder ainda maior, ou seja: “O PODER DA RECUSA”, resgatando assim a prerrogativa humana da vontade e da determinação na conquista da sobriedade.
Passa a acreditar cada vez mais em sua capacidade e possibilidade real de estacionar sua doença, suspirando e desejando por sua recuperação; entrando em contato com algo intenso, profundo e extremamente significativo: “O SEU QUERER” e, provavelmente, pela primeira vez em sua vida diz:
– “Eu não preciso beber, eu não preciso me drogar para conduzir minha vida e sentir-me feliz. Posso viver com determinação, alegria, coragem, experimentando a vida de um jeito sereno e sóbrio.”
– “EU DESEJO A MINHA LIBERTAÇÃO!”
Este, sem dúvida, é o melhor caminho para quem quer estar bem e em paz consigo mesmo, com os outros e com o mundo, experimentando uma intensa sensação de plenitude, capacidade e força. Sua postura é de quem quer viver e gozar a imensidão de um universo com seus inúmeros desafios e prazeres, como se entrasse em um verdadeiro êxtase de escolha, renovação, dignidade, sobriedade e, acima de tudo, responsabilidade.
E ainda que tenha caminhado por trechos tão difíceis e pedregosos, descobre que a recuperação pode ser vivenciada com alegria, sabedoria e, porque não dizer, com um grande prazer, reintegrando sua autoestima, seu auto-respeito e se transformando em uma nova pessoa, emocionalmente madura e espiritualmente evoluída. E de peito aberto vai seguindo, se abrindo, enfrentando vigilante sua nova caminhada de vida, sem pressa, a cada dia e a cada 24 horas.
NA VIAGEM DA RECUPERAÇÃO O GRANDE “BARATO” É SENTIR,QUE POUCO A POUCO, A ALMA VAI SE VESTINDO DE SERENIDADE E ALEGRIA.